A evolução das fraudes financeiras e os desafios do setor diante das transações em tempo real no Brasil.
Carlos Santa Cruz (CTO) e Rogério Freitas (diretor-geral no Brasil) da Lynx Tech falam ao IT Section sobre como a inteligência artificial tem transformado a prevenção de crimes financeiros — e por que o Brasil demanda soluções específicas e inovadoras.
IT Section: Nos últimos anos, como evoluíram os métodos de fraude e lavagem de dinheiro no setor financeiro? Há alguma tendência específica que mais preocupa hoje?
Carlos Santa Cruz: Podemos dizer que o cenário atual de fraudes e lavagem de dinheiro está em constante evolução em todo o mundo. A tendência que mais preocupa é a engenharia social. A tecnologia permite que, mesmo sendo o cliente quem realiza a transação, ele o faça de maneira involuntária, a fim de atender aos fins do fraudador.
IT Section: Como a inteligência artificial tem aprimorado a identificação e prevenção de crimes financeiros? Quais são os desafios mais complexos ao aplicá-la nesse contexto?
Carlos Santa Cruz: A inteligência artificial tem contribuído muito na identificação de padrões comportamentais dos clientes. Em casos de fraude, como mencionamos, muitas vezes é o próprio cliente quem realiza as operações, porque ele está sendo enganado. Essas operações fogem do padrão habitual dele e se assemelham ao comportamento típico de fraudadores. Desse modo, a IA ajuda a reconhecer as discrepâncias entre a movimentação legítima e a conduta maliciosa.
IT Section: Com a evolução da tecnologia e das ameaças, como vocês veem o papel dos reguladores? O setor financeiro está conseguindo acompanhar as novas exigências de segurança?
Carlos Santa Cruz: Os órgãos reguladores estabelecem as bases para um sistema financeiro seguro, exigindo que o setor adote ferramentas de prevenção a fraudes e de monitoramento de transações. O objetivo é proteger o cliente, que é o elo mais fraco nesse ecossistema.
Rogério Freitas: Um ponto fundamental da regulação é criar padrões mínimos que todas as instituições compreendam e implementem. Caso contrário, cada uma seguiria sua própria abordagem, reduzindo a eficácia do sistema como um todo.
Carlos Santa Cruz: As regulamentações costumam ser simples, como a obrigatoriedade de monitoramento transacional.
Rogério Freitas: Por exemplo, se um cliente não registrar seu dispositivo na instituição financeira, ele só poderá realizar até R$ 1.000 por dia em transações Pix. Se o dispositivo for registrado, poderá operar valores maiores conforme acordado. Caso contrário, o limite é aplicado automaticamente. Se ele tenta realizar um Pix de R$ 4.000 de um dispositivo nunca usado para um destinatário com quem nunca transacionou, a instituição consegue identificar o risco rapidamente. Então, a regulamentação ajuda inclusive a direcionar a análise da própria fraude.
IT Section: Pode compartilhar um caso recente em que a Lynx Tech ajudou uma instituição financeira a evitar uma grande fraude?
Carlos Santa Cruz: O BCP (Banco de Crédito do Peru) vem definindo novos padrões em prevenção de fraudes com nossa solução. Logo após sua implementação, o sistema da Lynx Tech detectou um número incomum de abertura de contas em horário atípico, bloqueando as operações suspeitas. Com esse tipo de abordagem proativa, o BCP reduziu em 30% os incidentes de fraude.
IT Section: O Brasil tem características particulares no combate a crimes financeiros?
Carlos Santa Cruz: Uma característica única do Brasil é o uso massivo do Pix. Isso torna a transferência de recursos muito rápida, o que, ao mesmo tempo, facilita certos tipos de fraude. Por isso, o sistema financeiro do país exige um monitoramento mais robusto.
Rogério Freitas: Não só robusto, mas, acima de tudo, em tempo real. O Banco Central impõe que uma transação Pix seja concluída em até 1,2 segundo, o que demanda sistemas altamente responsivos.
Carlos Santa Cruz: As práticas de fraude que acontecem no Brasil são semelhantes às que vemos no México ou na Europa, mas aqui temos a questão das transações instantâneas, que não existem ou não são tão amplas em outros mercados.
Rogério Freitas: O Pix tem sido um vetor para tipos específicos de fraude. Facilitou o uso de laranjas, pois agora é muito mais fácil abrir contas e movimentar dinheiro rapidamente. Além disso, há uma nova tendência ligada a apostas (bets) e aplicativos do tipo “Jogo do Tigrinho”, que também são usados para lavagem de dinheiro. Essa combinação de Pix, contas laranja e bets é algo que ainda não vimos em outros países. É uma característica própria de aliar recursos para cometer fraudes, somos muito criativos nesse sentido.
IT Section: Como a Lynx Tech pretende expandir sua atuação no país?
Carlos Santa Cruz: Atualmente, temos cinco grandes clientes no Brasil, mas nosso objetivo é abrir uma subsidiária no país. Queremos ter presença local para continuar ajudando o setor financeiro na prevenção de fraudes. Apostamos fortemente no mercado brasileiro, que sempre foi uma prioridade para nós.
IT Section: Quais são as principais inovações que a Lynx Tech está trazendo para o mercado em 2025? Como essas tecnologias se diferenciam das soluções tradicionais?
Carlos Santa Cruz: Nossa principal inovação são os sistemas de aprendizado contínuo. Modelos como o ChatGPT, por exemplo, se baseiam em uma “foto” da internet em determinado momento. Mas, no dia seguinte, tudo já mudou. Por isso, é necessário que os sistemas aprendam de forma constante e em tempo real. Nossa tecnologia aprende com cada operação realizada pelos clientes das instituições financeiras, o que permite ajustes diários.
Rogério Freitas: Tradicionalmente, seria necessário ter uma equipe de cientistas de dados reunindo uma massa crítica para análise, o que poderia levar meses. No nosso caso, temos um processo autogerado que faz essa atualização todos os dias, que, aliado a uma análise em tempo real com resposta em milissegundos, nos dá uma vantagem competitiva crucial.
IT Section: Como vocês imaginam que será a próxima grande revolução no combate a fraudes financeiras? O setor está preparado para essa transformação?
Carlos Santa Cruz: A próxima grande revolução virá da combinação entre diferentes tecnologias de inteligência artificial. Tomar decisões com base na conclusão de múltiplos sistemas é muito mais eficaz do que confiar em uma única fonte. Acreditamos que a tecnologia avançará nesse sentido, com várias inteligências trabalhando simultaneamente para oferecer decisões mais seguras e precisas.