O anúncio do chatbot público da DeepSeek, ocorrido recentemente, trouxe uma série de questões à tona – principalmente porque seus criadores disseram ter gasto apenas US$ 6 milhões no seu desenvolvimento – ao contrário do seus concorrentes, que têm investido bilhões no desenvolvimento de soluções de IA generativa.
Logo após seu lançamento, parecia que a Inteligência Artificial criada por uma empresa chinesa dominaria todo o cenário – empresas norte-americanas, como a OpenAI, perderam bilhões de dólares do dia para a noite e a liderança de mercado exercida pela dona do ChatGPT, Google e Microsoft estava ameaçada. Porém, um mês depois, vemos que o cenário é muito mais complexo do que o que se imaginava.
DeepSeek: IA pode não ser tão barata assim
A empresa de análise de semicondutores SemiAnalysis conduziu uma investigação detalhada sobre a DeepSeek e o seu modelo de funcionamento. De acordo com a empresa, o valor de US$ 6 milhões anunciado pela DeepSeek é apenas uma fração do investimento total.
Segundo o relatório da SemiAnalysis, a DeepSeek possui uma infraestrutura robusta, incluindo aproximadamente 50 mil GPUs da arquitetura Hopper da NVIDIA. Esses recursos são utilizados para treinamento de IA, pesquisa e modelagem financeira em várias localidades. O investimento total em servidores é estimado em cerca de US$ 1,6 bilhão, com custos operacionais adicionais de aproximadamente US$ 944 milhões.
Além dos investimentos em hardware, a SemiAnalysis também afirmou, em seu relatório, que a DeepSeek tem se concentrado em inovações arquitetônicas para otimizar o desempenho e a eficiência de seus modelos. Uma dessas inovações é o Multi-Head Latent Attention (MLA), introduzido no DeepSeek V2 em maio de 2024. O MLA reduz significativamente a quantidade de memória necessária para o KV Cache [mecanismo usado pela IA para processar e gerar texto] por consulta, diminuindo-a em cerca de 93,3% em comparação com os mecanismos de atenção usados pela concorrência – os processos de atenção são usados para determinar o sentido das mensagens.
Violações de segurança e censura
Em janeiro último, pesquisadores descobriram um banco de dados da DeepSeek exposto na internet, com mais de 1 milhão de registros sensíveis. Entre as informações vazadas estavam históricos de chats dos usuários, chaves de API e detalhes internos do sistema. Embora a empresa tenha corrigido rapidamente o problema, a facilidade com que o banco de dados pôde ser encontrado levanta preocupações sobre a maturidade dos protocolos de segurança da desenvolvedora chinesa.
Outro ponto diz respeito sobre a política de privacidade da DeepSeek. O texto informa os usuários sobre o envio de dados comerciais e pessoais para a China, incluindo texto ou áudio, prompts, arquivos enviados, feedback, histórico de bate-papo ou qualquer outro tipo de conteúdo enviado pelo usuário. Além disso, a IA também pode coletar informações sobre o dispositivo sendo usado, sistema operacional, e endereço IP. A questão é: o que a DeepSeek pode fazer com esses dados?
As empresas chinesas são obrigadas por lei a entregar qualquer informação ao governo chinês quando solicitado. Isso significa que qualquer empresa que opere na China, especialmente no setor de tecnologia e inteligência artificial, pode estar sujeita a regulamentações que exigem a concessão de acesso a dados, códigos-fonte e modelos de IA caso o governo considere necessário.
No caso da DeepSeek, essa obrigação levanta preocupações sobre a segurança e a privacidade dos dados, especialmente para empresas estrangeiras que possam utilizar seus serviços. Diferente de empresas ocidentais, que operam sob marcos regulatórios mais transparentes e com regras rígidas de proteção de dados, empresas chinesas frequentemente enfrentam desafios para ganhar a confiança do mercado global devido às potenciais interferências estatais. Esse fator pode limitar a adoção do DeepSeek fora da China, especialmente em mercados onde compliance e governança de dados são prioridades estratégicas, como União Europeia e Estados Unidos.
Qual é a vantagem competitiva da Microsoft?
A vantagem da Microsoft não está apenas na qualidade da sua inteligência artificial, mas na sua capacidade de criar um ecossistema interconectado, no qual a IA se torna um facilitador natural do fluxo de trabalho. O Copilot não é um assistente isolado: ele está embutido nas aplicações corporativas mais utilizadas no mundo. Isso significa que um profissional pode gerar relatórios detalhados no Excel, automatizar e-mails no Outlook, revisar documentos no Word e até melhorar a colaboração entre times no Teams — tudo com a IA da Microsoft integrada diretamente nesses sistemas.
Além disso, a Microsoft tem um diferencial essencial: confiabilidade e compliance. Empresas ao redor do mundo já utilizam seus serviços em larga escala e confiam na segurança e privacidade dos seus dados dentro da plataforma Azure. Com certificações de conformidade para diversas regulamentações internacionais, incluindo GDPR e a LGPD no Brasil, o Copilot se apresenta como uma solução que não apenas melhora a eficiência dos negócios, mas também oferece uma camada adicional de segurança e governança.
Esse é um fator crítico que diferencia o Copilot de soluções como a DeepSeek. Enquanto a DeepSeek enfrenta desafios de credibilidade devido à sua política de privacidade e à regulamentação chinesa sobre acesso a dados, a Microsoft já possui um histórico consolidado de proteção da privacidade dos usuários e empresas. Para empresas que lidam com dados sensíveis, especialmente nos setores financeiro, jurídico e de saúde, confiar em uma IA que opera dentro de um ambiente seguro e auditável não é apenas uma vantagem — é uma necessidade.
Outro ponto que reforça a posição do Copilot é o suporte contínuo e a evolução da plataforma. A Microsoft investe pesadamente em desenvolvimento, aproveitando a parceria com a OpenAI para garantir que seus modelos estejam sempre entre os mais avançados do mercado. O Copilot está em constante adaptação e aprimoramento, enquanto empresas como a DeepSeek ainda precisam provar que podem manter um ritmo sustentável de inovação, sem comprometer a experiência do usuário.
No fim das contas, o sucesso de uma IA generativa no mercado corporativo não depende apenas de sua eficiência técnica, mas também de sua capacidade de se integrar perfeitamente aos processos empresariais. A DeepSeek pode ter impressionado com seu lançamento e promessa de baixo custo, mas ainda precisa superar desafios estruturais que a Microsoft já resolveu há anos. E, nesse jogo, a confiabilidade, a segurança e a integração continuam sendo fatores decisivos para as empresas que realmente querem usar IA para impulsionar seus negócios.
*Por Audreyn Justus, Diretor de Compliance da Solo Network.