A transformação digital, impulsionada pela Inteligência Artificial, domina as pautas estratégicas com a promessa de eficiência, inovação e vantagens competitivas decisivas. Contudo, a jornada para concretizar essa visão é repleta de obstáculos que transcendem a aquisição de tecnologia. Os desafios mais críticos são, na verdade, profundamente humanos e estruturais, exigindo uma navegação cuidadosa entre a cultura organizacional, a integridade dos dados e um cenário de riscos em constante mutação.
O primeiro e mais persistente desafio continua sendo a adesão das equipes. A resistência cultural, historicamente apontada como principal entrave à inovação, não desapareceu. Para superá-la, a estratégia exige mais do que treinamento: é mandatório o envolvimento direto da liderança para patrocinar a mudança.
Em seguida, vem o pilar que sustenta toda a estrutura: os dados. A eficácia da IA depende diretamente da qualidade do tratamento de dados, e aqui reside uma vulnerabilidade crítica. Dados dispersos, não padronizados ou enviesados impedem a geração de insights de qualidade e podem levar os modelos a decisões erradas. Pior ainda, a própria manipulação dos dados que treinam os modelos de IA pode comprometer a integridade das defesas digitais de uma empresa, transformando um ativo em um passivo de segurança.
Essa vulnerabilidade nos leva ao campo da cibersegurança, onde o fator humano é a linha de frente. Com 99,9% dos ataques de hackers visando as credenciais dos colaboradores, a conscientização se torna uma missão contínua e estratégica. O desafio é amplificado pelo uso malicioso da IA, que agora arma adversários com ferramentas para criar campanhas de phishing personalizadas e ataques complexos, como o ransomware de dupla extorsão. O impacto financeiro é real: o custo médio para se recuperar de um ataque do tipo já ultrapassa 1,5 milhão de dólares, segundo os mais recentes relatórios.
Para orquestrar essa realidade, a governança surge como um imperativo. Adotar a IA sem comprometer a conformidade e a ética é prioridade máxima. A necessidade de uma governança rigorosa, transparência nos processos e adesão a regulamentações, como a Lei da IA da União Europeia, é fundamental para garantir o uso responsável da tecnologia e construir confiança no mercado.
Finalmente, um desafio estrutural ameaça a sustentabilidade do avanço tecnológico: o impacto ambiental. Com a projeção da Agência Internacional de Energia, atualizada em abril de 2025, de que o consumo elétrico de data centers e IA deve mais do que dobrar até 2030, atingindo um patamar superior ao consumo de todo o Japão, a expansão da IA impõe uma severa pressão ecológica.
A verdadeira transformação digital não se compra, se constrói. Ela é erguida sobre os pilares da liderança engajada, da cultura de dados, da ciber-resiliência e da responsabilidade socioambiental. Ignorar qualquer um desses elementos é colocar em risco não apenas o projeto, mas o futuro do próprio negócio.
Por Claudio Reina, diretor-executivo da Lattine.





