Muito se fala sobre a Indústria 4.0 como uma revolução de máquinas, sensores e dados. Imaginamos robôs autônomos e algoritmos de Inteligência Artificial otimizando cada etapa da produção. No entanto, pela minha experiência acompanhando de perto a digitalização de grandes operações fabris, posso afirmar que o pilar mais crítico (e muitas vezes negligenciado) dessa transformação não está no hardware, mas nas pessoas. A verdadeira revolução começa quando consolidamos um “digital workplace” eficiente para quem está no chão de fábrica.
O entusiasmo pelo tema não é para menos. As projeções indicam que o mercado de Indústria 4.0 no Brasil pode chegar a US$ 5,62 bilhões até 2028, com um crescimento anual de 21%. Contudo, a América Latina representa hoje apenas 7,2% do mercado global, segundo dados da Agência de Notícias da Indústria. Isso revela um potencial gigantesco, mas também um alerta: para capturar essa oportunidade, precisamos acertar na estratégia. E ela passa, invariavelmente, por capacitar e conectar a força de trabalho.
O paradoxo da modernização
Na prática, o que observo com frequência são empresas que investem em maquinário de ponta, mas mantêm uma estrutura de suporte de TI fragmentada e reativa, resultando em um cenário de alta complexidade.
Equipamentos críticos param e a intervenção precisa ser imediata, mas a heterogeneidade de sistemas legados e novos dificulta um diagnóstico rápido. Quando uma nova planta é aberta, a complexidade de TI se multiplica. O “jogo de empurra” entre diferentes equipes de suporte se torna um dreno de produtividade e cada minuto de inatividade representa perda financeira e de competitividade.
É nesse ponto que a modernização do ambiente de trabalho digital se torna o ponto de partida para o sucesso. Antes de conectar as máquinas entre si (IoT), precisamos garantir que as pessoas que as operam estejam perfeitamente conectadas a uma estrutura de suporte ágil e inteligente.
O alicerce da fábrica conectada
Imagine um chão de fábrica onde o trabalhador, ao identificar uma falha, abre um chamado em um sistema unificado. Imediatamente, o Service Desk integrado a um Centro de Operações de Rede (NOC) analisa o problema, sem transferências de responsabilidade. Se uma intervenção física for necessária, os serviços de campo (Field Services) entram em ação. Com rotas otimizadas e técnicos com acesso a todo o histórico do equipamento, a resolução se torna proativa, não reativa.
Essa abordagem muda o jogo. A automação de processos, que antes parecia distante, passa a ser aplicada no controle de qualidade e no monitoramento, evitando desperdícios e garantindo a conformidade com as rígidas normas industriais. O suporte se torna flexível, capaz de atender múltiplas localidades com a mesma eficiência, combinando expertise local com uma visão centralizada. O resultado direto é a drástica redução do downtime (ou tempo inoperante) e o aumento da produtividade fabril.
Contudo, a mudança mais profunda que defendo é a de mentalidade: precisamos parar de medir o sucesso apenas com métricas técnicas. É por isso que insisto na transição dos tradicionais Acordos de Nível de Serviço (SLAs), focados em tempo de resposta, para os Acordos de Nível de Experiência (XLAs). O que realmente importa não é se o chamado foi atendido em X horas, mas sim se a experiência do operador foi fluida, se ele se sentiu amparado e se conseguiu retomar sua função produtiva com agilidade. O XLA mede o sucesso do ponto de vista de quem mais importa: o usuário final.
Em suma, a Indústria 4.0 é, sim, sobre tecnologia, IoT e dados. Mas sua fundação é humana. Um chão de fábrica verdadeiramente conectado é aquele no qual cada colaborador possui as ferramentas e o suporte necessários para extrair o máximo potencial da tecnologia à sua disposição.
A transformação digital na manufatura não começa com a compra de um novo robô, mas com a garantia de que a pessoa ao lado dele está totalmente conectada, capacitada e produtiva.
*Por Rony Pieri, Head de Operações no Brasil da Getronics.





